Um parecer técnico apresentado
nesta quinta-feira (9) pelo Ministério Público Federal (MPF) aponta
um superfaturamento de R$ 613,3 milhões nas obras da refinaria Abreu e
Lima, em Pernambuco. A obra foi executada através de um contrato entre o Consórcio
Nacional Camargo Corrêa (CNCC)(prestadora do serviço de construção) e a Petrobras (a
contratante da obra). O superfaturamento apontado anteriormente pela Polícia
Federal era de R$ 167 milhões. No documento do MPF não é explicado
detalhadamente quais obras dentro da Abreu e Lima foram contratadas acima do
preço. A exceção é a subcontratação da Sanko Sider pelo CNCC.
Ainda de acordo com o documento
do MPF, o superfaturamento de R$ 613,3 milhões aponta lucro do CNCC de 26% do
valor contratual, quando deveria ser de 9,9%. “Com isso, a relação entre
receita e os custos (rentabilidade) pode alcançar um patamar de quase 26%, dos
quais 16% de forma irregular”, diz um trecho do parecer técnico. Abreu e Lima
deve ser concluída no fim desse ano, com três anos de atraso em relação ao
cronograma inicial. A obra foi orçada em US$ 2,5 bilhões, mas no meio do ano a
Petrobras estimava que gastou cerca de US$ 18 bilhões. A presidente da estatal,Graça
Foster, já cogitou que a conta final chegue a US$ 20 bilhões.
O laudo foi feito com base nas
investigações da operação Lava Jato, que investiga corrupção para o
superfaturamento de contratos em obras da Petrobras. O laudo do MPF ganhou
corpo com a contribuição o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor de
Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. Eles aceitaram um acordo
de delação premiada, em que contam à Justiça Federal o que sabem
sobre o esquema em troca de uma possível redução de pena. Os dois atuavam
diretamente na relação entre a estatal, as empresas contratadas e políticos,
que recebiam parte do dinheiro desviado e davam sustentação para o esquema, de
acordo com investigadores.
Na quarta-feira (8/11/14), Youssef e
Costa participaram de uma audiência na 13º Vara Criminal da Justiça Federal em
Curitiba e abriram o jogo. Os dois contaram em detalhes como o esquema de
superfaturamento em contratos e o pagamento de propinas aos envolvidos
funcionava na maior empresa brasileira, a Petrobras.
Os dois delatores confirmaram
que 3% do valor dos contratos firmados entre a estatal e empresas que
participavam de um cartel eram distribuídos entre agentes políticos de
três partidos: PT, PMDB e PP. Eles também detalharam o esquema de
pagamento de propina e realização de contratos fraudulentos na estatal, que
ocorria pelo menos desde 2005, segundo o doleiro Youssef.
Ambos disseram ainda que atuavam
a mando de “agentes políticos”, os quais não puderam ter os nomes citados no
depoimento, já que possuem foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal.
Conforme os réus, o vencedor das licitações era acordado previamente entre as
empresas, os agentes políticos e diretores da estatal. Youssef revelou que as
empresas que não quisessem colaborar com o esquema não ganhavam obras. “Toda
empresa de porte maior já sabia que tinha que pagar o pedágio em qualquer obra
que ela fosse fazer na área de abastecimento da Petrobras”, disse.
Divisão
Conforme os depoimentos, a
divisão dos 3% era feita de acordo com cada obra ou diretoria – 2% do
valor ia para o PT, por meio da diretoria de Engenharia e Serviços,
comandada por Renato Duque. O porcentual de recebimento era maior em
comparação com outras diretorias, pois Duque geria desde o processo licitatório
até a entrega da obra.
Nas diretorias de Gás e
Energia e Exploração e Produção, também do PT, os 3% eram totalmente
direcionados ao partido. Quando questionado sobre quem faria a distribuição do
dinheiro aos agentes políticos, Costa afirmou no depoimento que seria o
tesoureiro do partido, João Vaccari. O presidente do PT, Rui Falcão,
divulgou nesta quinta uma nota em que repudia com "veemência e
indignação" as declarações "caluniosas". Em nota, a Secretaria
Nacional de Finanças do PT negou as acusações feitas pelo ex-diretor da
Petrobras de que João Vaccari Neto, secretário nacional de finanças da sigla,
era o responsável por repassar os 3% de propina nos contratos da Petrobras
destinados ao PT.
O presidente do Partido
Progressista (PP), o senador piauiense Ciro Nogueira, afirmou que seu
partido não abrirá nenhum procedimento interno para apurar as acusações.
"Não temos instrumento para isso. Temos que confiar na Polícia Federal, no
Ministério Público e na própria CPI", disse Nogueira. O vice-presidente da
República, Michel Temer, que é o presidente nacional do PMDB, afirmou
por meio de sua assessoria que a legenda não vai se manifestar sobre esse
caso.
Já as diretorias da estatal
comandadas pelo PP, como a de Abastecimento, dirigida por Costa, e
pelo PMDB, como a diretoria Internacional – comandada por Nestor
Cerveró e, anteriormente, por José Zelada – dividiam o 1%
restante entre os partidos (que ficavam com 60% dessa fatia). Os diretores
responsáveis e o doleiro Alberto Youssef, que repassava o dinheiro ao PP, e Fernando
Soares, conhecido como Baiano e ligado ao PMDB, dividiam os 40% restantes. Até
2008, a fatia de Youssef era repassada ao então comandante do negócio, o
ex-deputado federal José Janene (PP-PR), morto em 2010. O grupo
reservava ainda 20% da verba para as despesas operacionais. As informações
constam nos depoimentos de Costa e Youssef.
Outras irregularidades
O laudo do MPF também aponta
irregularidades na prestação de serviços da Sanko Sider para o CNCC.
Em primeiro lugar, o parecer aponta pagamentos injustificados no valor de R$
38,7 milhões do CNCC para a Sanko. A investigação busca entender se os
contratos poderiam ser fictícios somente justificar o repasse de dinheiro, sem
nenhum tipo de prestação de serviço. Em segundo lugar, a Sanko Sider não
poderia estar na lista de fornecedores da Petrobras por descumprir alguns
requisitos legais. Mas, o laudo do MPF dão detalhes que requisitos faltariam a
empresa.
Os técnicos do MPF também apontam
um prejuízo de R$ 16,2 milhões para a Petrobras evidenciados na planilha de
custos do contrato com o CNCC. O MPF acredita que a Sanko forneceria produtos
para a obra, que seriam usados pelo Consórcio CNCC. Na conclusão dos técnicos,
“foram adotados sempre o maior preço (que aumentou 1.624%) e a maior quantidade
(que sofreu um incremento de 288%)”. O contrato também já superou o valor
máximo estimado, que serve como um teto para a companhia. De acordo com o MPF,
o valor foi superado em R$ 406,9 milhões “e o contrato ainda nem foi
encerrado”.
Outro lado
Em nota, a Sanko Sider afirma que
todas as vendas ocorrem por meio de contratos legítimos. De acordo com a
empresa, "os pagamentos ocorrem pelo sistema bancário, contra notas
fiscais devidamente contabilizadas e tributadas".
O Consórcio Nacional Camargo
Corrêa (CNCC) enviou nota nessa sexta-feira (10). O documento diz
"não procede a acusação de sobrepreço, uma vez que o contrato foi
conquistado por licitação pública de menor preço e a avaliação de sobrepreço
deve ser considerada pelo preço global e não por itens isolados." "O
próprio laudo pericial da Polícia Federal atesta a inexistência de
superfaturamento na compra de 200 mil itens de tubulação por parte do consórcio
junto à empresa Sanko, cujos produtos e serviços entregues são facilmente
comprováveis", finaliza.
A defesa do ex-diretor da área
Internacional da Petrobras Nestor Cerveró reforçou, em nota divulgada nesta
sexta-feira, a linha que adotará em relação aos depoimentos. O advogado Edson
Ribeiro alega que a delação premiada de Costa e Youssef é ilegal, pois foi
acertada sob coerção e prisão dos dois. "As declarações de Paulo Roberto
Costa devem ser analisadas com reservas. Ele estava sob pressão, já que estava
preso e na expectativa de que sua família fosse, também, processada e
presa", diz a nota do advogado. Nessas condições, argumenta, o depoimento
não poderia ser considerado espontâneo. "Toda e qualquer forma de
violência ou ameaça, física ou moral, na obtenção da deleção premiada, leva à
invalidade da prova", diz a nota.
Por: Gazeta do Povo (Curitiba)
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