Uma ponte aqui, um viaduto ali,
uns terminais acolá. Quando junta tudo, o tamanho da inércia assusta: são 424
contratos com obras paralisadas em Pernambuco. Quem fez o cálculo foi o
Tribunal de Contas do Estado (TCE). Somadas, essas obras representam um
investimento de quase R$ 4 bilhões. Perto de 40% desses recursos já foram
devidamente pagos. Ou seja, R$ 1,46 bilhão gasto com projetos que estão
parados, atrasados, em ritmo lento ou que, sequer, saíram do papel. O resultado
disso? Terminais integrados prontos e sem uso (R$ 50 milhões pagos), dragagem
de rio iniciada e paralisada (R$ 76 milhões), barragem com dois anos de atraso
e ainda sem conclusão (R$ 324,56 milhões), um viaduto que deveria custar R$ 14
milhões, mas que já consumiu R$ 45 milhões e ainda está longe de ficar pronto.
Em comum, essas obras carregam em seu DNA a falta de planejamento e, em alguns
casos, erros grosseiros de concepção. Além do evidente prejuízo para a
população, o desperdício de dinheiro público implica numa pergunta que costuma
ficar sem resposta:quem vai pagar essa conta?
A barragem de Serro Azul em Palmares está no topo da lista das obras mais caras e inacabadas. Foto: ITEP.
O rastreamento foi feito com base
nas informações repassadas por todas as prefeituras e governo do Estado ao TCE
na prestação de contas de 2014. Entrou no radar dos técnicos as obras que
estavam paralisadas, com prazo de entrega muito atrasado ou sem execução. Dos
424 contratos mapeados, 46 possuem valores acima de R$ 20 milhões. Eles somam
quase R$ 3 bilhões de investimentos. No pacote de pendências, velhos conhecidos
da população pernambucana. A Barragem Serro Azul, em Palmares, na Mata Sul,
aparece no topo da lista elaborada pelo TCE. É a obra mais cara entre as que
estouraram o prazo. Anunciado pelo ex-governador Eduardo Campos em 2010 para
combater as enchentes na região e reduzir o déficit hídrico do Agreste, o reservatório
deveria ter ficado pronto há mais de dois anos. A data de entrega inicial era
julho de 2013. Depois de períodos paralisada, a construção foi retomada e agora
o governo promete colocá-la em operação no final deste semestre.
É uma obra emblemática. Carrega
duas características onipresentes em praticamente todos os projetos públicos:
terminou muito mais cara do que começou e sofreu mudança estrutural no projeto
que, claro, repercutiu no preço. Era para custar R$ 246 milhões. Ganhou
aditivos e mais aditivos e pulou para R$ 324,56 milhões (só em obra física).
Ficou, portanto, 32% mais cara. O aumento dos custos chamou a atenção do TCE,
que fará uma auditoria especial. O X da questão: os técnicos alegam que não
havia razão para mudança na solução dada na construção do reservatório porque o
problema (nesse caso, o tipo de solo da fundação de um dos lados da barragem)
já havia sido identificado desde o projeto executivo. “Se já se sabia disso,
por que o projeto já não foi concebido pensando nessa solução?”, questiona
Rogério Carvalheira, que coordenou o levantamento feito pelo TCE. Para ele, a
resposta é simples: falta de planejamento.
Estação fantasma. T.I Cosme Damião custou R$ 18 milhões. Foto: Max Resdefault.
Nesse quesito, o legado deixado
pelas obras de mobilidade anunciadas para a Copa do Mundo, em 2014, é o exemplo
mais contundente de tudo o que não se deve fazer na hora de planejar uma
intervenção pública. Não se trata apenas de deixar pelo caminho obras
inacabadas, mas de não conseguir conectar sequer o que foi executado. Os
engenheiros do TCE Fábio Couto e Caio Melo, responsáveis pela fiscalização das
obras dos corredores de BRT Norte e Sul e Leste-Oeste, afirmam que a precária
qualidade técnica dos projetos criou situações de flagrante desperdício de
dinheiro público. Entre tantos exemplos, eles citam o Terminal Integrado Cosme
e Damião, que custou R$ 18 milhões e hoje está fechado, sem uso. Só abre em
dias de jogo da seleção brasileira, como o que ocorreu na última sexta-feira.
Ali perto, o viaduto do Ramal da Copa, com suas ferragens ainda expostas,
sintetiza o absurdo: pulou de R$ 14 milhões para R$ 45 milhões. A obra,
paralisada, não tem prazo para ser entregue e prevê duas pistas exclusivas para
os ônibus do sistema BRT que deveriam desembarcar no TI Cosme e Damião.
O detalhe é que o terminal
inicialmente projetado para receber os BRTs ficou fora do sistema e hoje nem
transporte comum opera no local. Diante da determinação da conselheira do TCE
Teresa Duere obrigando o Estado a dar um uso social para o espaço, o TI está
sendo adaptado para virar um posto de serviço do Detran. Na prática, será o
posto de serviço do Detran mais caro da história. Do quintal da sua casa,
localizada em frente ao terminal, o jardineiro Laércio Oliveira, 53 anos,
contempla o monumento ao desperdício. “Para a gente aqui, é só uma paisagem.
Não serve para nada.”
Por: Ciara Carvalho/Jornal do Commercio/Recife.
Obs: as legendas nas imagens postadas são de responsabilidade do Blog VZN
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