sexta-feira, 12 de maio de 2023

A importância das escadarias na zona norte do Recife na década de 1960

 

Escadaria construída na Zona Norte do Recife na gestão do prefeito Augusto Lucena (1964-1969). Foto: Revista O Cruzeiro (1967).

O texto a seguir, feito pelo jovem jornalista do Diário de Pernambuco em 1969, Samir Abou Hana. O texto mostra as dificuldades e o cotidiano da população pobre dos morros da periferia do Recife no final da década de 1960, onde muitas coisas mudaram. As casas de taipa, deram lugar as casas de alvenarias e muitas se verticalizaram. As escadarias surgidas durante a ditadura militar e na audácia do prefeito Augusto Lucena, considerado por muitos, o melhor prefeito que o Recife já teve. Hoje, as escadarias ganharam corrimões e a qualidade de vida das pessoas em comparação aos dos anos 60, melhoraram bastante, apesar que muitas pessoas passam pelas mesmas dificuldades do passado, mas já podemos ver muitas pessoas com carros e motocicletas e os ônibus subindo o morro. O que nunca mudou foi a superlotação dos ônibus, esses continuam do mesmo jeito de antes. Leia o artigo publicado pelo Diário de Pernambuco, no sábado de 28 de junho de 1969, e tire suas próprias conclusões.

É MAIS FÁCIL SUBIR O MORRO PELA ESCADA (Dizia o título). Pouca gente sabe que nas extensas filas que se formam nas paradas de ônibus, nas horas de maior movimento, estão pessoas que residem em mocambos pendurados nos morros de Tejipió, Casa Amarela, Vasco da Gama, Nova Descoberta ou Beberibe.

Nesses bairros, chamados populares, apesar de existirem casas ajeitadas, onde habita a classe submédia, em ruas próximas à avenida e ao transporte, as outras mais além não passam de casebres, onde mora a “raia miúda”, a plebe, a população mais humildes desta metrópole do Nordeste. São pessoas que saem da fábrica ou do biscate e vão arrear o corpo enfadado num colchão duro de capim ou numa esteira.

Mesmo assim o casebre é tão querido e a soneca tão almejada. É que gastam energia quando descem ou sobem os morros e altos. Suam no trabalho ou no biscate. Uns cansam da própria caminhada pela cidade, à procura do ganha-pão! Andam em ônibus lotados, com a impaciência enervando o corpo, a fome afetando a serenidade e a revolta causando tristeza.

É nessas horas que o mocambo é tão querido e o repouso ansiosamente aguardado. O cansaço e a fome pedem a cama de colchão duro ou a esteira no chão frio e úmido.

Um exemplo – No Alto do Mundo Novo, no Vasco da Gama, a ladeira vai subindo, subindo... Parece um nunca acabar. Dá a impressão de que o fim terminará juntinho do céu... Está lá para quem quiser ir. Num dos lados há o acesso ao Alto Treze de Maio, bem mais elevado, repleto de mocambos e crianças nuas e barrigudas fazendo astúcias nos casebres dos vizinhos.

A Prefeitura calcula em três quilômetros e meio a extensão das duas elevações. Pois, bem: toda essa caminhada fatigante é percorrida por quase dez mil pessoas que sobrevivem por aquelas bandas, mas que tentam o ganha-pão no centro da cidade. Empregados, uns; ambulantes, outros; biscateiros e uma quantidade enorme de pais de família sem qualificação profissional, perambulando o dia inteiro em busca de uma viração.

Escadarias – Bem-feitas e com degraus de altura máxima atingindo vinte centímetros. Augusto Lucena (prefeito anterior) edificou cerca de quarenta escadarias e, agora, o prefeito Geraldo Magalhães pretende construir outras tantas. Onde não for possível abrir estradas a Prefeitura fará escadas por entre os mocambos e morros escarpados, com descansos (espaços mais alongados) após cada lance de dez degraus.

O que se tem verificado, ultimamente, é que o aterro dos alagados e a derrubada de favelas, com modernização dos nossos subúrbios, que vão adquirindo características de núcleos habitacionais da classe média, os mocambos estão sumindo das zonas planas. E a pobreza, sempre pobreza, sem meios até de pagar uma prestação de casa popular do BNH (Banco Nacional de Habitação), vai se mudando de local. É a peregrinação da miséria que vivia no centro mas que, cada vez mais, sobre os morros enxotada pela civilização que ainda não beneficiou a todos.

Há favelas em Beberibe, por exemplo, onde as casas penduradas em pequenas barreiras. Ameaça permanente de desabamento e risco de vida a todo instante.

Nessa história de mocambaria há um aspecto interessante. O córrego, a subida e a rua central de cada cimo de alto são locais privilegiados porque apresentam casinhas já com feições de residências, bem ajeitadas. Já as casas afastadas da rua, atrás uma das outras, cravadas nas ladeiras dos morros, montadas em barreiras, de acesso mais difícil, têm aparência lastimável. A taipa vai caindo e as paredes se apresentam como esqueletos. Finalizou.

Samir Abou Hana foi secretário de imprensa na gestão do prefeito Augusto Lucena. Foto: Arquivo de família.

Samir Abou Hana, de origem libanesa por parte de pai e pernambucano de nascimento. O grande comunicador das rádios e televisão pernambucana, ficou conhecido nos meios de comunicação por saudar seus ouvintes com uma "ternurinha" e por acalentar os corações de muitos com o seu "conselho de coração" com sua voz poderosa e única. Por reinvindicar melhorias para a população, que ganhou destaque durante a grande enchente de 1975, ficou conhecido como "O Secretário da Cidade". Samir Abou Hana faleceu aos 79 anos, na sexta-feira, do dia 10 de dezembro de 2021.

Por: Jânio Odon/VOZES DA ZONA NORTE

Fonte: Diário de Pernambuco, Jornal do Commercio e Folha de Pernambuco.




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