Cemitério de Beberibe (atual cemitério de Águas Compridas) no Caenga em 1933. Foto: Jornal do Recife.
Luciano Eugênio de Mello, era um
homem de grande prestígio social e político no povoado de Beberibe, dono de
grandes propriedades e criador de gado. Durante as crises sanitárias no povoado
de Beberibe em 1857 e 1878, provocada por animais, que derrubavam a cerca de
arame do antigo cemitério de Beberibe, que ficava próximo a igreja e ao leito
do rio, para pastarem, e deixavam em exposição, restos cadavéricos que exalavam
no ar, um odor putrefato, além de poluir o rio com restos mortais. Uma
verdadeira calamidade pública que se prolongou por mais de duas décadas sem que
as autoridades governamentais da Província tivessem tomado quaisquer
providências.
Diante do apelo popular, o então
capitão Luciano Eugênio de Mello, católico fervoroso, cedeu parte do terreno no
Caenga em 1882, que foi aprovada pela Assembleia Legislativa Provincial, que
liberou a quantia de 4:304$913 (quatro contos, trezentos e quatro mil,
novecentos e treze réis). Em maio de 1885, liberou mais 2:000$000 (dois contos
de réis), além de contar com a ajuda de colaboradores do povoado de Beberibe,
segundo relatou o capitão Luciano Eugênio. O Cemitério de Beberibe (atual
cemitério de Águas Compridas) foi inaugurado num domingo, em 15 de abril de
1888.
O Jornal do Recife em 18 de abril
de 1888, publicou uma carta enviada pelo capitão Luciano Eugênio de Mello,
respondendo a uma crítica de um morador do povoado de Beberibe, pelo qual o classificou
de “máscara” por manter-se no anonimato, disse que o capitão contou para as
pessoas que foi ele que construiu o cemitério com seus próprios recursos, sem
ajuda de ninguém. O capitão Luciano Eugênio rebateu a crítica escrevendo uma
carta a redação que dizia o seguinte:
Acudo ao reclamo feito por um
morador de Beberibe, que sinto não ter ele querido descobrir-se para ser
conhecido, se é um dos que não concorreram para a construção do cemitério, cuja
necessidade se impunha a todos os moradores daquele lugar.
Pergunta-me o máscara se o
Cemitério de Beberibe foi feito somente a minha custa, e me atribuo ter
afirmado, que fora edificado só por mim! Não fiz no cemitério, e em qualquer
outro lugar semelhante declaração, e não duvidaria, que recebi de alguns
distintos moradores de Beberibe a importância a de 336 mil réis, que me fizeram
obsequio de remeter a minha casa, deixando de receber de outros, que assinaram
e não pagaram.
Recebi também o auxílio de um dia
do mestre de pedreiro Manoel Rodrigues, na última semana; José Paulo Pedreiro,
dois dias e Manoel dos Santos, que preferiu ter o salário de dois mil réis
diários, embora não se contasse o sexto dia
e receber mil e seiscentos diários, conforme lhe propus; alguns
serventes preferiram trabalhar a mil réis, com perda de um dia, a trabalhar por
oitocentos réis diários, os quais são moradores
em minhas terras, e jamais pagaram renda ou aluguel; e por três vezes
compareceram uns trinta a mais moradores meus, que trabalhavam das nove à uma
da tarde.
Foram estes os auxílios que
recebi para construção do Cemitério de Beberibe, no qual trabalhei desde 7 de
janeiro do corrente ano até 4 deste mês, tendo três a quatro pedreiros e perto
de vinte trabalhadores diários, e uma carroça, boi e carroceiro; e ainda não
está de todo concluído o serviço, que a todos apresenta.
E confesso meus agradecimentos a
todos os que me auxiliaram no árduo serviço de que me encarreguei, entre eles o
digno gerente da estrada de ferro, que transportou gratuitamente 400 alqueires
de cal, empregados na obra.
Creio, que o auxílio recebido
está bem representado e foi meu propósito não falar, como não procurar amigo
algum fora dos residentes do povoado de Beberibe, e só recebi óbolo dos que
mandavam levar à minha casa.
Sei, que alguns assinaram e não
pagaram, e outros não concorreram com esportula alguma, e que outros deixei de
dirigir-me.
Entretanto, está feito, bento, e
servindo, e assim satisfeita uma grande necessidade do local. Renunciei os
lucros e vantagens garantidas pelo meu contrato com a Câmara Municipal de
Olinda a favor da Irmandade de Nossa Senhora da Conceição, ereta na igreja
Matriz. Se o Diário de Pernambuco dando notícia da benção do cemitério atribuiu
a mim só a construção, não foi essa notícia direta ou indiretamente prestada
por minha parte.
Os que me conhecem e viram o
serviço, sabem, que não sou dos que procuram aparecer a custa, e com sacrifício
dos outros. Aos desafetos deixo plena liberdade de me julgarem a seu sabor.
Não presto contas, porque não sou
obrigado; mas se o máscara quiser, venha com seu nome desafivele o envoltório
de que se serviu e será confundido, como são os zoilos, e invejosos do conceito
alheio, que os mortifica.
Basta!
Recife, 17 de abril de 1888.
Por: Jânio Odon/VOZES DA ZONA
NOTE.
Fonte: Jornal do Recife.
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