sexta-feira, 13 de agosto de 2010

O terrível e tenebroso Males

Porto do Recife
O Porto do Recife seguia sua rotina tranqüila e movimentada no transcorrer de novembro de 1685, mais algo terrível, maligno e inesperado estava preste a acontecer com a chegada do navio francês Oriflamme procedente da Ilha de São Tomé, Costa da África, em cujo carregamento havia uns barris fechados de carne salgada porém deteriorada, pois tinham sido levados, fazia meses, de Pernambuco para Angola, pelo mesmo navio e na África, por descuido, não foram desembarcados nem examinados, retornando ao Recife depois de longo espaço de tempo.

O navio Oriflamme, após atracar no Porto do Recife, teve os barris de carne levados para um depósito na Rua da Praia, abriram-se alguns destes barris contendo carne de boi, achava-se em tamanho estado de putrefação que às suas exalações mefíticas imediatamente caíram por terra, o tanoeiro (quem produz barris) e mais quatro ou cinco pessoas de serviço, falecendo todos em poucas horas. Além disso, o mau cheiro pavoroso e pestilento logo se espalhou por toda vizinhança, invadindo o bairro inteiro, alastrando-se por Santo Antônio, pela Boa Vista e, por fim chegando à Cidade de Olinda, sempre com efeitos maléficos e devastadores. Do litoral, a peste propagava por toda a Capitania de Pernambuco, causando um sem número de vítimas, todas fulminadas ao simples acometimento da moléstia até ali desconhecida do povo em geral, que lhe dava o nome de “MALES”. O horror tomou conta de toda a Capitania e as pessoas não sabiam como se precaver desse mal tão devastador, pois na época, a medicina ainda não havia alcançado o patamar tecnológico dos dias atuais.

Por falta de um medicamento eficaz, as pessoas em desespero, começaram a apelar por formulas nada convencionais, como utilizar sobre a pele sangue de purgas e sanguessugas; abrirem pombos e colocarem em cima dos pés, por cinco, ou seis horas; improvisarem emplastros da variada natureza, inclusive de passa de figos, cebolas, estercos de pombos e manteiga. Também eram usados xaropes e cozimentos a base de ervas e o louvável óleo de copaíba (copaifera officinalis), vegetal nativo, muito usado pela população, por curar diversas outras mazelas. Entretanto, nada conseguia conter a epidemia da MALES, atingindo à Bahia, em Abril de 1686, perdurando até 1692.

Em Pernambuco, a epidemia não dava trégua, e a população apavorada e desamparada da ciência dos homens, o povo apelou para a proteção divina, apelou para Deus, superlotavam as igrejas, pronunciavam orações especiais, realizaram solenes procissões. Normas de asseio corporal e de temperança alimentar foram preconizadas. E, finalmente, combateu-se a corrupção dos costumes. Os médicos fizeram ver ao capitão-general de Pernambuco que, “em semelhantes contágios, assim para comover a misericórdia de Deus como para se não se comunicar a malignidade da doença pelos atos e abusos venérios”, havia que evitar as prostitutas e os amancebamentos públicos.

O Governador de Pernambuco, diante da explanação dos médicos, tomou uma atitude radical, determinando a expulsão das prostitutas para fora do Recife e a prisão de todas as mulheres livres ou escravas que depois do toque da Ave-Maria fossem encontradas nas ruas desacompanhadas de homens considerados responsáveis. Todas essas normas e providências, executadas numa verdadeira campanha profilática, foram recomendadas pelo Dr. João Ferreira da Rosa, principalmente, e pelo Dr. Domingos Pereira da Gama, médico pela Universidade de Coimbra. A epidemia MALES, permaneceu em Pernambuco, em surtos periódicos, quase anuais, até 1695, quando entrou em declínio e cessou, após dez anos de devastação.
PESQUISA: Livro Anais Pernambucano, de Pereira da Costa
Texto: Blog do Jânio.

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